sexta-feira, 10 de julho de 2015

Reforma política ou reforma dos políticos?


Reforma poltica ou reforma dos polticosO historiador Arnold Toynbee dizia que “O maior castigo para aqueles que não se interessam por política é que serão governados pelos que se interessam”. Bertold Brecht falava do “analfabeto político”, o alienado que não se interessa pelo assunto. Mais sofrem os que ignoram a advertência de Platão: “A punição que os bons sofrem, quando se recusam a agir, é viver sob o governo dos maus”. Nos países cleptocratas (governados pela lógica dos ladrões poderosos) a descrença nas instituições é avassaladora. Por isso é que a reforma política passou pela Câmara dos Deputados com a velocidade da luz. O ódio das massas em relação aos políticos e à política explica sua completa alienação. As massas já desistiram deles. A desconexão entre os representados e os representantes é quase absoluta.


Reforma poltica ou reforma dos polticos

Uma boa parcela do povo que não confia na democracia representativa tende a ser mais participativa em redes sociais e em iniciativas populares. Mais de 50 mil assinaturas nós conseguimos na nossa campanha M1M e M2M: Máximo um Mandato para o Executivo e Máximo dois Mandatos para o Legislativo (veja fimdopoliticoprofissional. Com. Br). A Câmara dos Deputados, em primeiro turno, aprovou o fim da reeleição para cargos executivos (Presidente, Governador e Prefeito). Pesquisa do Datafolha, feita em 17 e 18 de junho/15, mostra que 67% apoiam essa iniciativa. Virada histórica (porque eram somente 33% há 10 anos). É de se elogiar a evolução da conscientização do eleitor em relação a esse tema. Mas resta limitar os mandatos no Legislativo (dois no máximo), o “recall” e o fim do voto obrigatório.

A cada dia que avançava nossa campanha notávamos a nítida mudança de posição do eleitor (em 2005, apenas 33% eram favoráveis ao fim da reeleição; o número subiu para 39% em 2007; agora alcançou o patamar de 67%). O fim da reeleição é uma providência acertada e, especialmente, muito boa para o País. Basta ver o segundo mandato de FHC ou de Dilma (desastrado) para se constatar o quanto custa para a nação uma reeleição: todos os limites da responsabilidade (fiscal, monetária, tributária, econômica, financeira etc.) são ultrapassados quando em jogo está a reeleição de um presidente ou governador ou prefeito. Claro que a máquina pode ser usada em qualquer situação, com ou sem reeleição. Porém, não podemos esquecer da nossa herança personalista, que vem do povo ibérico (aqui o passado não vira passado). Quando em jogo está nosso personalismo, sobretudo na política, os níveis de (ir) responsabilidade se alteram agudamente. Daí o acerto do fim da reeleição.

Resta agora a luta pelo M2M (Máximo dois Mandatos para o Legislativo). Com isso acabaríamos com o político profissional (o que não larga a política por nada, sobretudo quando a corrupção o alimenta). Decretar o fim do político profissional não significa decretar o fim da sua carreira política (que pode ser também orgânica, dentro do partido, nos bastidores). Como cidadãos, o que achamos um absurdo é, por exemplo, um Renan Calheiros ou um Collor da vida (sucessores de Sarney) se perpetuar no poder cleptocrata vigente no nosso País. Todo político, depois de dois mandatos, deveria ficar afastado da política institucional pelo menos dois outros mandatos.

Sua perpetuação no poder institucional não traz aprimoramentos para o progresso, ao contrário, tem sido no Brasil um retrocesso. É ruim para o País e para todos nós, sobretudo quando se sabe que os políticos e os partidos (normalmente) não contam com projetos sustentáveis em favor de todos. Seus interesses particulares são sempre priorizados. Com o abandono da sua profissão original, muitos passam a viver de negociatas, maracutais e “acordos”. Tornam-se profissionais extremamente “caros” e péssimos exemplos para a nação. Daí a imperiosa necessidade de se impor um limite aos mandatos no Legislativo também.

Também faltou discutir (na reforma política em andamento) o “recall”, que é a destituição do governante que se mostra incompetente ou corrupto. O eleitor que tem o poder de eleger tem que ter também o poder de deseleger. Com um percentual do eleitorado (1, 2 ou 5%) já se poderia abrir o processo de “recall” (que é uma cassação popular). Admitido o processo, a Justiça eleitoral (tendo motivos comprovados) já deveria cautelarmente afastar o ocupante do exercício do cargo (respeitado o contraditório), até o dia marcado para o eleitorado se manifestar (pela manutenção ou destituição do eleito).

Nossa jovem democracia ainda carece de muitos aprimoramentos. Mas eles não acontecem quando nos acomodamos. A luta deve ser contínua. Melhorar a democracia é como criar um filho ou uma filha. Todos os dias temos regar essa árvore para que ela floresça. Se nos acomodamos, quem cuida dela são os políticos cleptocratas (feitas as exceções honrosas).

Luiz Flávio Gomes, Professor
Jurista e professor. Fundador da Rede de Ensino LFG. Diretor-presidente do Instituto Avante Brasil. Foi Promotor de Justiça (1980 a 1983), Juiz de Direito (1983 a 1998) e Advogado (1999 a 2001).

Juventude decepcionada: Brasil é dos políticos velhos (e velhacos)

Juventude decepcionada Brasil dos polticos velhos e velhacos
Lula disse: “O PT está velho”. Não somente o PT: com raríssimas exceções, todos os partidos políticos envelheceram. O Globo (28/6/15: 3) mostrou a sangria de jovens na vida partidária: de 2009 a 2015 todos os grandes partidos apresentaram queda nas filiações de jovens: PT menos 60%, PMDB perdeu 59%, PSDB 51%, PDT 53%, PP 49%. O número de filiados jovens caiu 56% (no período indicado). A política, mesmo depois da abertura do voto aos 16 anos, continua sendo coisa de velhos. Pior: cada vez mais velhacos (de acordo com a imagem que os jovens fazem dos políticos). Ou seja: os partidos políticos no Brasil envelheceram e também envileceram mais (se tornaram mais vis, mais vilões, mais desprezíveis, mais ignóbeis). A política (para o jovem) se transformou em algo asqueroso. Dela, ele (em geral) quer distância. A decepção da juventude é incontestável.
Os adolescentes não desistiram do País nem do seu futuro: 84% confiam que as reformas poderiam melhorar a nação; mas ao mesmo tempo 63% deles nem sabem que o Congresso está debatendo uma reforma política (veja DataSenado). Grande parcela da juventude continua de costas para a política. Os gregos chamavam essa parcela de idiotes: são os que, podendo, não participam da vida pública. Os políticos, de forma inversamente proporcional, a trata cada vez com mais desrespeito (não preparando seu futuro por meio da educação de qualidade nem estimulando o senso de responsabilidade ou a cidadania globalizada).
Também os jovens estão desistindo dos políticos e dos partidos. Embora objetos centrais de uma polêmica interminável (redução da maioridade penal), cada vez participam menos das eleições: apenas 1.638.751 adolescentes com 16 e 17 anos votaram nas eleições de 2014 (contra 2.013.591 em 2008, 2.391.352 em 2010).
As mentiras que os adultos contam trazem cada vez mais desilusão aos jovens: praticamente toda mídia do final de semana 26/6 a 28/6/15 massacrou o PT (com razão), depois das revelações feitas pelo delator Ricardo Pessoa (do grupo UTC/Constram). O dinheiro das campanhas eleitorais do PT teria origem na corrupção da Petrobras. Ocorre que o grupo ajudou (em 2010) 14 partidos diferentes: PT, R$ 5,2 milhões; DEM, R$ 1,24 milhão; PSDB, R$ 1,2 milhão; PP R$ 663 mil; PDT 500 mil etc. Na campanha de 2014, 20 partidos receberam “doações” do grupo: PT R$ 10,8 milhões; PSD R$ 700 mil; PSDB R$ 655 mil; DEM R$ 615 mil; PMDB R$ 600 mil; PSB R$ 550 mil etc. Há alguém que acredita que somente o dinheiro para o PT seria sujo, enquanto o dinheiro dado aos demais partidos teria passado primeiro pela depuração da Imaculada Conceição?
Mentiras, velhacarias, decepções, corrupção, promessas não cumpridas, palavras não honradas, mordomias, gastos absurdos, construção de Shopping na Câmara dos Deputados etc.: tudo vem contribuindo para a baixa filiação dos jovens de 16 à 24 anos nos partidos políticos (eram 300 mil filiados em 2009, contra 132 mil em 2015). Na faixa etária de 25 a 34 anos houve queda (no mesmo período) de apenas 9,8% (O Globo 28/6/15: 3). Os partidos não se renovaram. O baixo interesse do jovem pelas eleições e pelos partidos confirma a sua descrença com a política institucional. Ele está desistindo da política (o número de eleitores adolescentes caiu 30% de 2010 a 2014). Isso é muito ruim para a cultura cívica.
A educação que os jovens recebem, em geral, não os prepara para a democracia cidadã. A participação nas redes sociais têm sido mais forte. Mas ocorre que nós somos campeões em indignação (veja as manifestações de junho/13 e março/15) e ridículos em ação coletiva. De 167 países, a democracia brasileira aparece na 44ª posição (veja Economist Intelligence Unit, citada por G. Ioschpe). Isso se deve à nossa baixíssima nota no item participação política (somos iguais a Mali, Zâmbia, Uganda e Turquia; estamos abaixo de Iraque, Etiópia, Quênia e Venezuela; campeão é a Noruega e a última colocada é a Coreia do Norte).
Os partidos têm que ser reinventados. Ou novos devem ser inventados. Em junho/15, 69% dos jovens de 16 a 24 anos afirmaram não ter preferência por nenhum partido político (Datafolha). Não há indiferença com o futuro nem com a democracia, sim, com a política. O mundo ganhou velocidade incrível depois da Terceira Revolução Industrial (que se globalizou). A forma clientelista, corrupta e fisiologista de fazer política no Brasil continua a mesma de dois séculos atrás. O descompasso é imenso. As instituições lentas ficaram para trás diante da vida veloz. O jovem não tem a mínima chance de disputar o jogo político, cada vez mais sujo e imundo, onde os políticos profissionais “são comprados” na cara dura pelos poderes econômico e financeiro. Política, dinheiro e poder se mesclam promiscuamente há séculos. Isso é muito vergonhoso e repugnante. Sobretudo para o desiludido jovem do terceiro milênio.
Luiz Flávio Gomes Professor
Jurista e professor. Fundador da Rede de Ensino LFG. Diretor-presidente do Instituto Avante Brasil. Foi Promotor de Justiça (1980 a 1983), Juiz de Direito (1983 a 1998) e Advogado (1999 a 2001). [ assessoria de comunicação e imprensa +55 11 991697674 [agenda de palestras e entrevistas] ]